http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Noticias/NoticiaMostra.aspx?idItem=53253&idPagina=3086
A Defensoria Pública obteve na última quarta-feira (17/12)
uma decisão judicial que determinou a interdição da clínica Voltar a Viver,
comunidade terapêutica para o tratamento de dependentes químicos localizada em
Cajamar, na região metropolitana de São Paulo, por maus tratos e tortura contra
pacientes.
A Justiça proibiu o recebimento de novos pacientes, sob pena
de R$ 50 mil para cada ingresso; deu prazo de 30 dias para a entrega de todos
os internos aos familiares ou a remoção para outras unidades, sob pena de multa
diária de R$ 50 mil; determinou fiscalizações semanais pela Vigilância
Sanitária e a exclusão do site da clínica em 48 horas.
Violações de direitos
Em inspeção no dia 9/12, o Núcleo de Cidadania e Direitos
Humanos da Defensoria Pública e o Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia
Ocupacional constataram diversas irregularidades e violações de direitos
humanos. Pacientes relataram sistemática prática de maus tratos e tortura,
violências físicas e psicológicas, como enforcamento, socos e chutes, aplicados
como forma de punição.
Um interno afirmou que foi agredido e teve o nariz e um dedo
quebrados, e clavícula e costela trincadas, sem receber atendimento médico.
Segundo relatos, a maioria dos internados involuntariamente (a pedido da
família) chega à clínica por meio do “resgate”, procedimento em que a pessoa é
enforcada e tem pernas e braços amarrados – caracterizando crime de sequestro e
cárcere privado. No dia 28/11, agressões a um interno foram o estopim de uma
rebelião, que culminou na fuga de vários pacientes e violências posteriores aos
recapturados, em represália.
Há relatos também do uso de um coquetel de medicamentos que
faz os pacientes dormirem por dias e da aplicação de castigos de isolamento.
Foram encontrados quartos pequenos ocupados por nove beliches, algumas
quebradas e com colchões em mau estado, e armários insuficientes. Havia apenas
um vaso sanitário funcionando e um chuveiro com água, para cerca de 80
internos.
A inspeção encontrou três adolescentes no local, de 13, 15 e
17 anos, violando-se a legislação, pois esse tipo de instituição só pode
receber adultos, e desrespeitando direitos básicos previstos no Estatuto da
Criança e do Adolescente. Também não há um procedimento de pedido de alta para
o paciente deixar o local; apenas informa-se aos internos e à família que a
saída implicaria quebra contratual, o que obrigaria ao pagamento de multa de
20% do contrato (que custa mais de R$ 36 mil).
Medidas judiciais
A pedido do Defensor Público Raul Carvalho Nin Ferreira,
Coordenador do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos, a Juíza Adriana Nolasco
da Silva, da 1ª Vara Judicial de Cajamar, também inspecionou a comunidade
terapêutica, no dia 16/12, determinando a remoção de alguns internos, por
temores de represálias por terem falado com a Defensoria.
Após ingressar como litisconsorte ativo (participação como
autora) na ação civil pública que já tramitava contra a comunidade terapêutica,
ajuizada pelo Ministério Público, a Defensoria pediu a interdição do
estabelecimento, que foi deferida. Nesta quinta-feira (18/12), a instituição
solicitou a instauração de um inquérito policial para investigação da prática
de tortura no estabelecimento.
Comunidades terapêuticas
As comunidades terapêuticas são regulamentadas pela
Resolução-RDC nº 29/2011 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
São serviços de tratamento a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso
ou dependência de substâncias psicoativas. Visam oferecer um ambiente
protegido, técnica e eticamente orientado, cujo principal instrumento
terapêutico é a convivência com outros pacientes, para resgate da cidadania,
reinserção social e reabilitação física e psicológica.
A responsabilidade por esses locais deve ser de profissional
de nível superior. Não há prescrição de medicamentos, mas são admitidas pessoas
usuárias de remédios controlados, desde que tenham as prescrições de seus
médicos particulares. Para ser admitido ao local, o paciente deve passar por
prévia avaliação médica. Recomenda-se que apenas pacientes com comprometimento
leve ou moderado sejam aceitos.
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