domingo, 23 de novembro de 2014

Em Brasília, seminário global debate pobreza e uma ‘sociedade de prosperidade compartilhada’

http://nacoesunidas.org/em-brasilia-seminario-global-debate-pobreza-e-uma-sociedade-de-prosperidade-compartilhada/
Conceitos foram debatidos no painel “O que significa um Mundo Sem Pobreza”, do I Seminário Internacional WWP, que teve início nesta terça-feira (18) com apoio da ONU.
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Em Brasília, seminário global debate pobreza e uma ‘sociedade de prosperidade compartilhada’
Publicado em 18/11/2014 Atualizado em 21/11/2014
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Conceitos foram debatidos no painel “O que significa um Mundo Sem Pobreza”, do I Seminário Internacional WWP, que teve início nesta terça-feira (18) com apoio da ONU.
Produção de cocadas no Jardim Jatobá, em Fortaleza, no Ceará. A família usa um crédito governamental para ampliar o negócio. Foto: Eduardo Aigner/MDS
Produção de cocadas no Jardim Jatobá, em Fortaleza, no Ceará. A família usa um crédito governamental para ampliar o negócio. Foto: Eduardo Aigner/MDS
Oportunidades de escolha para todas as pessoas, liberdade para exercê-las, mais segurança e direitos humanos assegurados caracterizam os que especialistas definem como um mundo sem pobreza. O conceito foi debatido no painel “O que significa um Mundo Sem Pobreza”, do I Seminário Internacional WWP, que teve início nesta terça-feira (18), em Brasília.
Mediada pela diretora do Banco Mundial para o Brasil, Deborah Wetzel, a primeira sessão traçou um histórico dos diferentes conceitos de pobreza e formas de medi-la. Para dar início ao debate, o professor James Foster, PhD em Economia pela Universidade de Cornell, traçou um panorama desta evolução.
“Em muitos casos, usa-se o índice de linha da pobreza para definir quem é pobre, sendo assim classificados os que vivem abaixo deste limite”, explicou Foster. “Porém, atualmente, mais de cem países adotam índices multidimensionais para medir a pobreza, que levam em conta não apenas renda e consumo, mas também aspectos como nível de educação, saúde, água e saneamento.”
Professor da Universidade da Cidade do Cabo, na África do Sul, o especialista Murray Leibbrandt compartilhou a experiência de seu país no combate à pobreza. “A África do Sul é um país de renda média, o que por si só já torna a experiência interessante”, disse.
“Com a democracia instaurada no país em 1994, não precisamos da pressão internacional para lutar contra a pobreza. Para nós a questão não envolvia apenas renda, mas diversos fatores que perpetuavam a desigualdade. Por isso, levamos em conta aspectos da saúde e da educação. Não estabelecemos uma linha da pobreza.”
O diretor do Escritório Responsável pelo Relatório do Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Selim Jahan, fez coro com Leibbrandt ao defender um índice multidimensional para medir a pobreza.
“Ter uma população vivendo acima da linha da pobreza não significaria seu fim, pois esse índice é baseado apenas em renda e consumo”, explicou o especialista. “O mundo sem pobreza, na verdade, significa um aumento de oportunidades para todos.”
Os participantes defenderam ainda uma metodologia que preze pela avaliação qualitativa dos vários fatores que determinam a pobreza. “A desigualdade tem um impacto não apenas econômico, mas também social e político. E muitas vezes é vista como uma injustiça social. Por isso ainda há muitas questões para nos engajarmos”, concluiu Jahan.
Durante a tarde, a ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza, Tereza Campello, participou do painel “A Experiência Brasileira na Superação da Extrema Pobreza”. Mediada pelo representante do PNUD no Brasil, Jorge Chediek, a mesa teve participação da economista-chefe de Desenvolvimento Humano na América Latina e Caribe do Banco Mundial, Margaret Grosh; a professora da Universidade de Tulane, Nora Lustig; o professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Emir Sader.
O evento se encerra nesta quarta-feira (19). Na parte da manhã, o vice-presidente sênior e economista-chefe do Banco Mundial, Kaushik Basu, abre o evento com o painel “Um mundo sem Pobreza é Possível?”. Participarão ainda Magdy Martinez-Solimán, diretor do Departamento de Políticas de Desenvolvimento do PNUD; Sergei Soares, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); e Tiago Falcão, do Ministério de Desenvolvimento e Combate à Pobreza.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Letalidade da ação policial: notas para reflexão

Importante texto, de 2011, sobre os altos índices de letalidade policial em São Paulo


In http://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/121919258/letalidade-da-acao-policial-notas-para-reflexao

Luiz Flávio Gomes e Adriana Loche*

O Brasil encontra-se, segundo estudos recentes, na sexta posição mundial em relação às taxas de homicídio por 100 mil habitantes. São mortes provocadas, majoritariamente, por armas de fogo e que atingem, sobretudo, a população jovem (15-24 anos) do sexo masculino (Mapa da Violência 2011).

Dentre os números dessa violência fatal, uma parcela significativa tem sido atribuída a ações das polícias estaduais, em especial à militar, nos chamados “autos de resistência” ou “resistências seguidas de morte”[1]. As mortes resultantes de ações policiais são um aspecto da violência policial, denominada letalidade policial.

Antes de tudo, é importante definir o que estamos entendendo por letalidade policial. O uso da força letal refere-se a situações em que a ação policial teve consequências fatais para o cidadão. Ainda que ocorra em situações de legalidade, existem regras específicas sobre seu uso que devem ser respeitadas. Por trás destas regras, está o reconhecimento de que o uso da força pela polícia implica uma série de riscos, em especial quando se trata do emprego de armas de fogo, mas também que a polícia não tem carta “branca para agir”, o que significa restrições ao uso da força letal.

Como a linha que separa a necessidade do abuso é bastante tênue, foram convencionados, a partir de estudos sobre o uso da força pela polícia, três parâmetros para aferir se uma polícia usa da força de forma arbitrária ou não, em especial se uma polícia tem um elevado índice de letalidade, que seria incompatível com sua função legal. São eles:

a) relação entre civis mortos e civis feridos em uma ação policial;

b) a relação entre civis e policiais mortos;

c) o percentual das mortes provocadas pela polícia em relação ao total de homicídios dolosos.

Os parâmetros acima surgem de estudos nos Estados Unidos, conduzidos por especialistas que tinham por objetivo a redução do número de tiroteios, justificados ou não, nas ações policiais[2]. É importante esclarecer que estes parâmetros devem ser analisados em conjunto, pois considerados isoladamente não são suficientes para definir o grau de letalidade de uma polícia.

Para analisar os parâmetros em seu conjunto, tomemos como exemplo o caso de São Paulo, cujas estatísticas oficiais sobre criminalidade são divulgadas, por força de lei estadual, desde 1995, e, portanto, permitem fazer uma análise histórica dos dados de homicídios e de resistências seguidas de morte no estado de São Paulo[3].

O primeiro parâmetro a ser analisado é o que se refere à proporção de civis mortos e feridos nas ações policiais. Como em uma guerra, em situações de confronto o que se espera é que o número de feridos seja sempre superior ao número de mortos.

Vejamos o que tem ocorrido em São Paulo, desde o ano de 2000:

Tabela 1: Mortes provocadas pelas polícias do estado de São Paulo





2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Total

Civis Mortos 595 459 610 915 663 329 576 438 431 549 517 6082

Civis Feridos 386 439 420 705 525 450 420 417 368 393 424 4947

Proporção* 154 1,05 1,45 1,30 1,26 0,73 1,36 1,05 1,17 1,39 1,22 1,23





Fonte: Estatísticas Trimestrais da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo

(*) Refere-se ao número de civis mortos para cada civil ferido.

O que podemos perceber é que, à exceção do ano de 2005, o número de mortos pela polícia sempre superou o número de feridos. Se a polícia mata mais do que fere, isto nos sugere que não são considerados os princípios de razoabilidade e de necessidade da ação. Mesmo em um caso de resistência armada, por parte de delinqüentes, cabe à polícia eliminar a resistência e não quem resiste.

O maior número de civis mortos em relação ao número de civis feridos é um fato preocupante. Os dados sugerem que há um incentivo – ou uma permissão - de uma postura mais agressiva da polícia no patrulhamento ostensivo, o que inevitavelmente aumenta o risco de abusos por parte dos policiais contra os cidadãos.

O segundo parâmetro refere-se à proporção de civis (não-policiais) e policiais mortosnas ações policiais. Se a polícia está constantemente em ações que colocam a vida dos policiais em risco, a proporção entre civis e policiais mortos em uma ação é um dado muito importante.

Embora haja uma dificuldade normativa em estabelecer o grau aceitável do uso da força letal pela polícia ou contra a polícia, há diversas tentativas de se estabelecer uma ratio. Por exemplo, o FBI utiliza a proporção de 1 policial morto para cada 12 não-policiais mortos.

Estudos desenvolvidos no Brasil assumem a ratio de 1:4[4]; outros estudos afirmam que quando a proporção de civis mortos em relação a policiais mortos é maior do que 10, a polícia usa a força letal de maneira desproporcional à ameaça, servindo a “propósitos outros do que a proteção da vida em emergências”.[5]

Analisemos os números de São Paulo para o período de 2000 a 2010:

Tabela 2: Mortes de civis (não-policiais) e policiais no estado de São Paulo





2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Total

Civis Mortos 595 459 610 915 663 329 576 438 431 549 517 6082

Policiais Mortos 49 49 59 33 27 28 38 36 22 22 27 390

Proporção* 12,1 9,4 10,3 27,7 24,6 11,7 15,2 12,2 19,6 24,9 19,1 15,5





Fonte: Estatísticas Trimestrais da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (*) Refere-se ao número de civis mortos para cada policial morto.

Se tomarmos como ratio a proporção de 10:1, conforme indicada nos estudos internacionais, vimos que apenas no ano de 2001 essa razão foi inferior. Observe-se que a média no período analisado foi de 15,5 civis mortos para cada policial morto, mais de 50% superior ao que se considera internacionalmente “justificável”.

Segundo o ex-Secretário Nacional de Segurança Pública, Cel. José Vicente da Silva Filho: “quando passa da taxa de dez civis mortos para um policial não há dúvidas de que há excesso de força e execuções”[6].

Como bem ressaltou a antropóloga Tereza Caldeira, “as mortes de civis em confronto dificilmente podem ser consideradas acidentais ou como um resultado do uso da violência pelos criminosos. Se fosse o caso, o número de policiais mortos também deveria aumentar, o que não é o caso. Em São Paulo, a razão entre mortes de civis e policiais é desproporcionalmente alta”[7].

E, por fim, analisemos o terceiro parâmetro, que diz respeito ao percentual das mortes provocadas pela polícia em relação ao total de homicídios dolosos.

Antes de tudo é necessário reconhecer os resultados do governo do estado e também dos governos municipais, em especial da Região Metropolitana, na redução dos homicídios em São Paulo desde o início da década.

Tabela 3: Homicídios dolosos e mortes por policiais no estado de São Paulo





2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Civis Mortos 595 459 610 915 663 329 576 438 431 549 517

Homicídio Doloso 12638 12475 11847 10954 8753 7592 6559 5153 4690 4799 4502

Proporção* 4,71 3,68 5,15 8,35 7,57 4,33 8,78 8,50 9,19 11,43 11,48





Fonte: Estatísticas Trimestrais da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (*) Refere-se ao percentual de civis mortos em relação aos homicídios em geral.

É interessante notar, ainda, que apesar dos homicídios dolosos terem reduzido em cerca de 65% entre os anos de 2000 e 2010, as mortes provocadas pela polícia não apresentaram uma queda na mesma proporção. Já as mortes pela polícia oscilam um pouco entre a queda e o aumento, mantendo-se na média de 550 mortes ao ano.

Se a violência letal da polícia estivesse correlacionada à necessidade de proteger a vida, era de se esperar que, com a queda dos homicídios, diminuíssem consideravelmente as mortes provocadas pela polícia. Mas, pelos números, podemos perceber que não é isto o que está ocorrendo em São Paulo.

Philip Alston, o relator especial da ONU para execuções sumárias, constatou que as polícias de São Paulo utilizam a força letal e não a inteligência para controlar o crime[8]. Mais do que isso, esta força letal é utilizada para a proteção do patrimônio e não da vida[9].

Ao se analisar conjuntamente os três parâmetros, podemos concluir que as polícias têm agido com alto grau de letalidade em suas ações, utilizando a força e a violência de forma desproporcional à ameaça representada e sem respeito aos direitos das pessoas e aos procedimentos legais.

Os números revelam que há uma violência desproporcional à ameaça apresentada e que o uso da força letal é uma prática deliberada e reflete uma política de controle da criminalidade pela violência, que coloca não apenas a vida de civis em risco, mas também a vida dos próprios agentes policiais.

É um fato que a polícia está autorizada a usar a força e é treinada para esta tarefa, mas quando o nível de força excede aquele considerado justificável, as atividades da polícia deveriam estar sob escrutínio público, não importa se ela faz parte do comportamento individual de determinado agente policial ou de uma prática institucional.

No entanto, casos envolvendo policiais nas resistências seguidas de morte raras vezes são investigados e quase nunca chegam à justiça. Na sua maioria são arquivados e os policiais continuam a agir, sem qualquer tipo de responsabilização.

As instituições policiais sabem que quando a força utilizada pelos seus agentes é superior àquela considerada necessária para conter a desordem ou o crime a autoridade policial tende a ser enfraquecida. O uso desnecessário da força pode até ser percebido como um símbolo de poder, mas pode ser igualmente interpretado como um sintoma da ausência de autoridade.

A violência policial, em todos os seus matizes, é um problema que afeta a qualidade de vida de todos os cidadãos, pois gera desconfiança nas agências responsáveis pela aplicação da lei, o que pode conduzir a respostas cada vez mais privadas – e violentas – de resolução de conflitos.

De outro lado, quanto mais se evidencia essa violência policial excessiva (abusiva), mais vai ganhando credibilidade a tese de que vivemos mesmo num permanente estado de guerra civil de todos contra todos. Mais se escancara a tese da profunda degradação ética e moral das nossas instituições. “Em países multiétnicos ou multirreligiosos como o Brasil, com grandes populações marginalizadas, a maquiagem étnica e religiosa da polícia busca refletir o padrão de domínio social. As várias combinações possíveis de terrorismo policial, repressão social, subdesenvolvimento institucional, imobilizam a polícia brasileira em um estado de falência moral e social crônica”[10]

Veja também:Homicídios: Brasil 6º no ranking mundialUPPs e autos de resistência (1/2)

*LFG – Jurista e cientista criminal. Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri e Mestre em Direito Penal pela USP. Presidente da Rede LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Blog: www.blogdolfg.com.br. Twitter: www.twitter.com/ProfessorLFG. Encontre-me no facebook.

* Adriana Loche – Socióloga. Doutoranda em Sociologia pela Universidade de São Paulo e Pesquisadora do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes.

[1] “Auto de resistência” é a nomenclatura utilizada no estado do Rio de Janeiro e “Resistência seguida de morte” é utilizada no estado de São Paulo para definir ações de confronto entre policiais e não-policiais que resultaram em morte.

[2] Chevigny (1991); Mayer (1983), Sherman & Langworthy (1979).

[3] Os dados do estado de São Paulo referem-se às polícias militar e civil. No entanto, cumpre dizer que a quase totalidade de mortes é provocada pela polícia militar, não só pelo caráter de sua atividade, mas também pelo tipo de formação recebida e pela cultura militarista que graça naquela instituição.

[4] Oliveira Jr, E. N. 2008. Letalidade da ação policial e teoria interacional: análise integrada do sistema paulista de segurança pública. Tese de Doutorado apresentada ao Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Sociais da Universidade de São Paulo. Disponível em:www.teses.usp.br/.../TESE_EMMANUEL_NUNES_DE_OLIVEIRA_JR.pdf

[5] Blumberg, M. 1994. “Police use of deadly force: exploring some key issues”. In: Thomas Barker & David Carter. Eds. Police Deviance. Cincinnati, Anderson Publishing Co.

Chevigny, Paul. 1991. "Police Deadly Force as Social Control: Jamaica, Brazil and Argentina", Série Dossiê NEV, n.2, p. 10. Núcleo de Estudos da Violência, USP, São Paulo.

[6] Jornal Folha de S. Paulo, 16 de julho de 2007.

[7] Caldeira, T. 2000. Cidade de muros: crime, segregação e cidadania em São Paulo. São Paulo, Editora 34/Edusp.

[8] Sobre esse tema ver relatório de Philip Alston, Relator Especial da ONU para Execuções Sumárias, quando da sua visita ao Brasil em 2007 (Relatório ONU - A/HCR/11/2/Add.2, 29/08/2008).

[9] Em nota explicativa, sobre a queda das taxas de crimes violentos no segundo semestre de 2009, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) afirmava: “Desde março a polícia tem focado suas ações em todo o Estado no combate aos crimes contra o patrimônio. A polícia está na rua para impedir o roubo, furto e latrocínio. Os resultados já começam a aparecer.”. Esta informação está disponível na íntegra no sítio da SSP/SP:http://www.ssp.sp.gov.br/estatisticas/downloads/nota_explicativa_2_tri_2009.pdf

[10] Mir, Luís, Guerra civil, São Paulo: Geração Editorial, 2004, p. 373.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Comissão da Câmara aprova projeto que regulamenta uso de armas não letais pela polícia

http://noticias.r7.com/brasil/comissao-da-camara-aprova-projeto-que-regulamenta-uso-de-armas-nao-letais-pela-policia-14112014

Do R7

Projeto aprovado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados pretende regulamentar o uso de armas com menor potencial ofensivo por policiais, a exemplo das armas elétricas e cassetetes de borracha.

A proposta aprovada na última terça-feira (11) determina que esses equipamentos deverão ser usados prioritariamente nos casos de abordagem a cidadãos desarmados, desde que o uso do armamento não letal não coloque em risco a integridade do agente de segurança.

De acordo com o projeto, também será proibido o uso de arma de fogo contra quem estiver em fuga desarmado ou contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, a não ser que represente risco imediato aos agentes ou a outra pessoa.

O projeto diz ainda que os cursos de formação de policiais deverão incluir conteúdo programático que os habilite ao uso de instrumentos não letais. O objetivo da proposta é diminuir o número de mortes causadas por policiais. Dados contidos no Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2013, 2.212 pessoas foram mortas em ações policiais em todo país; média de seis por dia.

Ainda de acordo com o projeto, quando o uso de arma não letal resultar em ferimentos, a polícia deverá assegurar a imediata prestação de socorro médico, bem como a comunicação do ocorrido à família.

Elaborado inicialmente no Senado, o texto aprovado na CCJ é um substitutivo do deputado Mauro Benevides (PMDB-CE). Como sofreu mudanças, a matéria retornará para análise dos senadores nos próximos dias.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Caso de mortes não esclarecidas de jovens da favela São Remo vai parar na ONU

Conforme repercutido pela Ponte.org
http://ponte.org/caso-de-mortes-nao-esclarecidas-de-jovens-da-favela-sao-remo-vai-parar-na-onu/

Gilmar Júnior, especial para a Ponte

Jovens foram mortos por PMs e tiveram fotos dos corpos expostas em redes sociais

Seis de setembro de 2014, o dia em que quatro famílias choraram juntas a morte de quatro jovens negros moradores da favela São Remo, próxima à USP (Universidade de São Paulo). Welinson (16), Jonas (17) , Luan (18) e Paulo (21). Segundo a polícia, o caso se tratava de uma perseguição a um carro roubado que iniciou sua suposta fuga no Rio Pequeno e seguiu por 10 km até chegar ao município de Cotia, onde a versão policial indica que os ocupantes da frente do carro – Paulo e Luan – dispararam contra os oficias, que revidaram matando os quatro. No dia seguinte, os familiares receberam as fotos dos corpos dos entes alvejados e duvidaram da versão da PM. A Defensoria Pública de São Paulo, também acredita que o caso merece mais explicações e, por isso, enviou um apelo à ONU (Organização das Nações Unidas) para que esse e outros casos semelhantes que ocorrem diariamente nas periferias sejam melhor esclarecidos.

O documento pede também a intervenção internacional para que as autoridades brasileiras tomem medidas preventivas contra execuções perpetradas por policiais e relatem seus achados ao Conselho de Direitos Humanos da ONU. O texto é endereçado a Christof Heyns, Relator Especial do órgão sobre Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias, e assinado pelos Defensores Públicos Samuel Friedman, Coordenador da Regional Infância e Juventude; Letícia Marquez Avelar, Fernanda Penteado Balera e Rafael Lessa Vieira de Sá Menezes, Coordenador do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos.

Balera explica que episódios como o da São Remo são recorrentes nas periferias de São Paulo, mas que na maioria das vezes os confrontos de informações só apresentam duas vertentes: versão da família x posicionamento da polícia. Entretanto, as fotos dos corpos denunciam um novo elemento para a discussão: “Entendemos desde o começo que esse caso é emblemático. As imagens apontam que a história da polícia não aconteceu. O número de tiros que os jovens tomaram e as fotos deixam claro que foi uma execução”, diz Fernanda Balera.

A intenção da Defensoria é que o apelo provoque pressão internacional e faça com que as investigações sejam mais imparciais em assuntos que envolvam violência policial. Balera conta que a Defensoria segue acompanhado o caso em todas as instâncias junto à Polícia Civil e Corregedoria ainda mais de perto. O documento enviado à ONU afirma que foi aberto, pela PM, um procedimento interno segundo o qual três dos policiais envolvidos haviam aparecido várias vezes em procedimentos anteriores sobre mortes de civis.

O destino das balas

De acordo com a nova medida, os quatro jovens receberam ao todo 30 tiros. Várias cápsulas de balas vazias foram encontradas perto das viaturas da PM, mas só duas perto da traseira do carro das vítimas, em posição inconsistente com a versão oficial do tiroteio. O jovem Luan Miguel da Silva foi o mais alvejado. Segundo Alan da Silva, responsável pelo reconhecimento do corpo do irmão no IML (Instituto Médico Legal), o garoto foi alvo de 13 tiros, contando com o “colar de balas” que envolviam o seu pescoço e as outras perfurações no abdômen, conforme mostram as fotos vazadas nas redes sociais. No dia do velório, o filho mais velho de uma família de sete irmãos, relata que uma das irmãs notou que o corpo de Luan continha escoriações que ainda não tinham sido vistas: ferimentos no peito feitos com algum objeto cortante, dedo anelar de uma das mãos dividido ao meio e dentes inferiores da boca quebrados ou ausentes. Segundo Silva, muitas dúvidas ainda não foram esclarecidas, como por exemplo, a autoria das fotos: “Tiraram fotos do meu irmão de dentro do IML. Eu vi. Impossível que não seja a polícia que tenha feito isso, porque lá não pode tirar foto. E outra, nas imagens dos meninos mortos no carro, mexeram em muita coisa. Numa foto o Paulinho estava no banco de trás do carro, em outra, na frente. Esse carro eu nunca vi, nem antes e nem depois da morte do meu irmão. Não deixaram que eu ou minha mãe víssemos o carro e nem pegar o celular do Luan que está apreendido até hoje, talvez tenha mais informações lá, mas não nos deixam pegar.”

Os defensores públicos apontam ainda outras inconsistências, como o grande número de marcas de tiro no parabrisas do carro onde supostamente os jovens estavam, o que torna contraditória a versão de que eles teriam saído do carro para trocar tiros com os policiais. Também é questionado o elevado número de marcas de tiro em áreas vitais do corpo das vítimas, a ausência de ferimentos nos policiais e de danos às viaturas.

Aviso prévio

No dia em a morte do filho mais velho completava quatro anos, Teresa Alves Pinheiros recebeu a notícia de que Paulinho, outro filho, havia morrido. Paulo Alves da Silva tinha 21 anos, era pai – assim como Luan, que deixou um filho de um ano – e segundo a mãe, era constantemente abordado pela polícia, que costumeiramente o comunicava de sua “sorte”. “Meu filho me contava que todas às vezes que ele era enquadrado os policiais diziam que ele tinha sorte porque ou ele estava acompanhado ou tinha gente vendo. Na sexta-feira antes dele morrer, um carro de polícia passou por ele e fez um gesto, como se fosse o ameaçando”, diz a operadora de máquina que viu o número de filhos reduzir de cinco para três.

Já Silva afirma que após a morte do irmão notou carros suspeitos circularem na rua onde mora. Ele diz que logo após o ocorrido com Luan, a irmã saía de casa quando uma viatura da polícia passou pela menina, deu ré, olhou para o rosto dela e depois foi embora. “Depois desse acontecimento, deu uma parada nisso, mas agora que o caso está voltando… Vai saber, né?”, comenta.

Outro lado

Procurada pela reportagem da Ponte na sexta-feira (14/11), a assessoria de imprensa da Polícia Militar de São Paulo não respondeu ao pedido de posicionamento até a publicação desta matéria.
Os questionamentos se deram sobre as supostas rondas da PM na região como forma de intimidação aos moradores; posicionamento sobre as fotos dos jovens mortos e o “colar de balas” no pescoço de um dos mortos; as fotos que foram parar nas redes sociais endereçadas aos familiares dos jovens, já que os policiais da operação são apontados como os responsáveis pela divulgação; e se a polícia havia encontrado algum erro na investigação do caso até o momento.

domingo, 2 de novembro de 2014

Decisão liminar determina que PM adote em protestos procedimentos sugeridos pela Defensoria Pública de SP

Veículo: DPE/SP

 Data: 29/10/2014 http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Noticias/NoticiaMostra.aspx?idItem=52538&idPagina=1&flaDestaque=V

 A Defensoria Pública de SP obteve na última sexta-feira (24/10) uma decisão liminar que garante o exercício do direito de reunião. A decisão também obriga o Governo do Estado de SP a elaborar um plano de atuação da Polícia Militar em protestos, com diversos encaminhamentos de medidas a serem adotadas. Em abril deste ano, a Defensoria Pública de São Paulo, por meio de seu Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos, havia ingressado com uma ação civil pública na qual pedia à Justiça a determinação de diversas medidas para coibir excessos por parte de policiais em manifestações públicas. A organização não governamental Conectas Direitos Humanos também se manifestou na ação, como “amicus curiae”.

Na decisão, o Juiz Valentino Aparecido de Andrade, da 10ª Vara da Fazenda Pública da Capital, observou que a Polícia Militar não estava preparada para lidar com as manifestações populares que ocorreram em 2013. "O que se viu, em 2013, foi uma absoluta e total falta de preparo da Polícia Militar, que, surpreendida pelo grande número de pessoas presentes aos protestos, assim reunidas em vias públicas, não soube agir, como revelou a acentuada mudança de padrão: no início, uma inércia total, omitindo-se no controle da situação, e depois agindo com demasiado grau de violência, direcionada não apenas contra os manifestantes, mas também contra quem estava no local apenas assistindo ou trabalhado, caso dos profissionais da imprensa".

A decisão liminar determina a elaboração de um projeto de atuação da polícia militar em reuniões populares, com diversos encaminhamentos sugeridos pela Defensoria Pública: dispersão somente em casos extremos, em que as circunstâncias demonstrem inequivocadamente que a ordem pública esteja a sofrer forte abalo e que não haja outra solução que não seja o de impor a dispersão das pessoas reunidas; não admissão do uso de armas de fogo ou com munição de elastômetro; uso de sprays de pimenta e gases somente em casos extremamente necessários; identificação dos policiais militares quanto ao nome e ao posto, em local visível à sua farda; detalhamento das condições em que ocorrerá a dispersão dos manifestantes; proibição de imposição de condições de tempo e de lugar ao exercício de reunião; e indicação do oficial que atuará como porta-voz do comando da Polícia Militar.

 O Magistrado ainda pontuou que, com tais medidas, o direito de reunião e o dever do Estado em garantir a ordem pública estarão em harmonia. “Nenhuma dessas medidas estará a obstaculizar que a ré [Estado de SP], por sua Polícia Militar, mantenha a ordem pública em face de protestos. Tais medidas buscam apenas garantir o legítimo exercício do direito fundamental de reunião, em sua convivência com o dever do Poder Público de garantir a ordem pública, observando-se a justa proporção entre tal direito e tal dever”. Cabe recurso da decisão.

 Processo nº 1016019-17.2014.8.26.0053

A cópia da petição inicial e da liminar podem ser acessados no sítio eletrônico da defensoria: http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Noticias/NoticiaMostra.aspx?idItem=52538&idPagina=1&flaDestaque=V

Passo final na indústria da loucura

Texto muito interessante para o debate sobre saúde mental.
 http://www.tribunademinas.com.br/passo-final-na-industria-da-loucura/

Quando o grupo chegou ao endereço da Rua Espírito Santo, no Centro, chamou a atenção de quem passava pela via. Os olhares destreinados na arte de enxergar os socialmente invisíveis exibiam incômodo. Pouco interessados no espanto alheio, dez homens que experimentaram uma existência de segregação em internações psiquiátricas de longa permanência tinham um compromisso inadiável com o futuro: conhecer a casa onde iriam morar sem amarras. Juntos, eles passaram pelo portão que dá acesso a um conjunto de apartamentos, mas, desta vez, as grades não estavam lá para proteger a sociedade da loucura deles e, sim, para afastar a violência urbana que, democraticamente, atinge a todos. Moradores de uma das dez novas residências terapêuticas em implantação no município até o final do ano, quando cem pessoas deixarão de ser pacientes da Casa de Saúde Esperança para tornarem-se usuários de serviços da cidade, eles inauguram, com atraso, uma nova fase na saúde mental: a do tratamento em liberdade. 

A partir de hoje, a Tribuna publica a série “Vidas roubadas”, que pretende discutir o processo de desinstitucionalização que desafia a cultura manicomial de Juiz de Fora, cidade conhecida por integrar o corredor da loucura, formado também por Barbacena e Belo Horizonte. Na década de 1980, os três municípios respondiam por 80% dos leitos psiquiátricos disponíveis no estado. Nesta época, os macro-hospícios somavam aqui quase dois mil leitos (ver quadro na página 4), a maior parte deles ocupado por pessoas que tinham como principal doença o abandono social. Trinta anos depois, restam 224 vagas na Casa de Saúde Esperança. Fundada em 1939, a unidade que está sob a gestão do Município constitui o último hospital psiquiátrico em funcionamento na cidade. A retirada dos pacientes cronificados é o passo final para o encerramento do capítulo da indústria da loucura, quando sete unidades psiquiátricas funcionavam a todo vapor, embora com qualidade questionável. 

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