Recomendo a leitura da ótima reportagem da Conectas sobre a repressão policial na última manifestação popular contra a Copa, que reproduzo abaixo, ou no seguinte link: http://www.conectas.org/pt/acoes/justica/noticia/19073-acao-da-pm-viola-normas-para-uso-da-forca
Para aprofundamento sobre o assunto, recomento o estudo do Código de Conduta para Policiais, da ONU, disponível em http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/ajus/prev18.htm e dos Princípios Básicos para Uso da Força e de Armas de
Fogo, também da ONU, disponível em http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/ajus/prev20.htm.
Da Conectas:
AÇÃO DA PM VIOLA NORMAS PARA USO DA FORÇA
POLÍCIA CERCEOU DIREITO À MANIFESTAÇÃO DE MANEIRA VIOLENTA E DESPROPORCIONAL
AÇÃO DA PM VIOLA NORMAS PARA USO DA FORÇA
POLÍCIA CERCEOU DIREITO À MANIFESTAÇÃO DE MANEIRA VIOLENTA E DESPROPORCIONAL
A pouco mais de 20 dias da Copa do Mundo, a Polícia Militar
de São Paulo dispersou na noite de ontem um protesto pacífico na região central
de São Paulo, fazendo uso excessivo da força e violando diversas normas que
regem a ação policial em manifestações.
Por volta das 19 horas, homens da Tropa de Choque lançaram
bombas de gás lacrimogêneo no meio da multidão, espalhando os manifestantes em
direções desencontradas, sem qualquer motivo fundamentado. Milhares de pessoas
que desciam a Rua da Consolação do sentido Centro foram repelidas à força pela
polícia e, ao completarem o caminho no sentido contrário, de volta para a
Avenida Paulista, encontraram uma nova formação de policiais, que deixou como
única saída o viaduto que liga a região da Consolação/Paulista à diagonal da
Avenida Dr. Arnaldo.
Enquanto as pessoas ainda passavam calmamente, seguindo o
corredor indicado, uma bomba de gás lacrimogêneo foi arremessada pela polícia
no meio da marcha. Em seguida, outras foram lançadas por escopeta, provocando
correria. Pessoas que estavam sob o viaduto correram risco de queda e viveram
momentos de pânico. Centenas entraram na estação Consolação intoxicadas pelo
gás lacrimogêneo que era sentido no subterrâneo do trem.
“A PM optou por dispersar uma marcha da qual participavam,
de maneira absolutamente tranquila, milhares de cidadãos”, disse o Rafael
Custódio, coordenador do Programa de Justiça da Conectas. “Não cabe à polícia
decretar quando um protesto deve ou não chegar ao fim. Essa não é uma
atribuição policial. O que deveria ter sido feito é garantir a segurança dos
manifestantes, não colocá-los em risco e cercear o direito de manifestação”,
disse.
Relatos também dão conta de que as estações Marechal Deodoro
e Consolação do metrô foi infestada por gás lacrimogêneo lançado por policiais.
Homens da Tropa de Choque também fizeram cordões e usaram viaturas para
direcionar os manifestantes para dentro das estações, decretando à força a
dispersão e o fim do protesto.
Normas claras
O trabalho da PM nestas circunstâncias é regido por normas
específicas que devem deve seguir estritamente. Conectas e o Núcleo
Especializado de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública de São
Paulo já haviam entregado à Secretaria de Segurança Pública do Estado de São
Paulo este conjunto de recomendações.
O documento tem como base a própria legislação brasileira,
além de recomendações das Nações Unidas, práticas consolidadas na União
Europeia e manifestações do Sistema Interamericano de Direitos Humanos da OEA
(Organização dos Estados Americanos), entre outros estudos, liminares e
acórdãos que constituem uma rede robusta de recomendações a serem seguidas
pelas forças policiais.
O texto foi entregue ao secretário de Segurança Pública de
São Paulo, Fernando Grella, em agosto de 2013, dois meses após o momento mais
crítico de violência policial contra manifestantes desde o início da onda de
protestos que tiveram como ponto de partida reivindicações sobre o preço do
transporte público na capital paulista.
Além de reafirmar a garantia constitucional do direito a
reunião pacífica “sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de
autorização”, o texto relembra que “todas as pessoas têm o direito de
associar-se livremente com fins ideológicos, religiosos, políticos, econômicos,
trabalhistas, sociais, culturais, desportivos ou de qualquer outra natureza”,
para listar, em seguida, alguns balizadores para a ação policial nestas
circunstâncias.
Trânsito
De forma clara, o documento diz que o Estado deve tolerar
inconvenientes urbanos, tais como interrupções do trânsito, para garantir o
direito de manifestação. Para isso, cita decisões do STF (Supremo Tribunal
Federal), além de acórdãos da Corte Europeia de Direitos Humanos e da Corte
Europeia de Justiça. Transtornos passageiros para o tráfego não justificam
dispersão de marchas e protestos.
‘Vandalismo’
O mesmo ocorre em relação a atos isolados de violência
durante os protestos, diz o texto, tais como “dano ao patrimônio público ou
privado ou agressão a terceiros”. Eles, por si só, “não convertem uma reunião
pacífica em violenta (...) devendo haver repressão pontual e localizada, para
deter os violentos e permitir que os outros manifestantes prossigam no
exercício do direito de reunião”. Neste item, o texto cita decisão da Corte
Europeia de Direitos Humanos em casos na Moldávia e na Áustria, nas quais é
realçada a obrigação dos Estados de “proteger os manifestantes, assegurando os
meios necessários para que o direito à reunião seja fruído regularmente”.
Choque
Em casos de ação policial contra atos ilícitos, o documento
sugere “a superação da doutrina da força progressiva pela doutrina da gestão
negociada”, cujo objetivo final é o da “proteção de direitos e a facilitação, e
não repressão, das manifestações”.
Para tanto, é fundamental que todos os policiais portem
“identificação ostensiva” e que a tropa de choque seja mantida “fora da vista
enquanto ela não for necessária”. Tais medidas reduzem a tensão e evitam uma
escalada de provocações e revides.
Dispersão
Nos casos extremos, “a decisão de dispersar uma reunião deve
ser tomada em linha com os princípios da necessidade e da proporcionalidade, e
só quando não houver outros meios disponíveis para proteger a ordem pública de
um risco iminente de violência”. A comunicação constante entre a polícia e os
organizadores das manifestações também é fundamental.
A decisão de dispersar um protesto – quando legítima – “deve
estar claramente comunicada e explicada, para obter, o mais breve possível, o
entendimento e a conformidade dos manifestantes. Tempo suficiente deve ser dado
para dispersar”, diz a recomendação, lembrando que “armas de fogo nunca devem
ser usadas com a finalidade de dispersar a multidão”.
Armas e munições
“Armas de fogo nunca devem ser usadas com a finalidade de
dispersar a multidão”, diz o texto. Também “bastões e equipamentos de impacto
semelhante não devem ser usados em pessoas que não são ameaçadoras e não
agressivas” e, quando usados, não devem visar zonas vitais do corpo.
O lacrimogêneo não deve ser usado em locais confinados, nem
disparado a curta distância ou contra o rosto das pessoas. Em caso de
ferimento, a polícia deve prestar socorro imediato, assim como recolher as
reclamações e identificar os acusados de abuso. Sempre que houver uso de armas
de fogo ou instrumentos de menor potencial ofensivo, “os agentes de segurança
pública deverão preencher um relatório individual”.
Filmagens
Considerando que “não há direito à privacidade na captação
de imagem e som de policiais no desempenho de sua função” a PM não deve impor
qualquer constrangimento a quem quer que esteja registrando a ação de
funcionários públicos em locais públicos, no desempenho de suas funções
públicas.
Por fim, o documento ressalta a necessidade de que “seja
fornecida capacitação técnica aos policiais militares que atuam em policiamento
de manifestações públicas”.
* As imagens usadas ao longo do texto têm a intenção de
ilustrar e exemplificar graficamente as infomações mencionadas, mas não foram
feitas no protesto de ontem (15/5), com exceção da primeira delas.
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